Quilombolas discutem mortes no parto de negras na rede pública de saúde no Amapá

A mãe da cabeleireira Iracema da Silva, de 42 anos, que teve sete filhos na comunidade quilombola do Curiaú, em Macapá, morreu após dar à luz a sétima filha numa maternidade. Para Iracema a morte da mãe poderia ter sido evitada se ela tivesse o acompanhamento médico adequado.

O caso é um dos que, segundo o Instituto de Mulheres Negras do Amapá (Imena), simbolizam as situações de mortalidade materna em negras do estado e estão sendo discutidas em um encontro entre quilombolas e profissionais da saúde naúltima sexta-feira (23), no Centro de Macapá.

Os partos da minha mãe eram sempre naturais, em casa. Ela ficava resguardada até se sentir bem e se levantar. Ela estava com úlcera no estômago e foi para a maternidade. Ela teve a minha irmã e logo após mandaram ela se levantar, tomar banho. Mas ainda tonta, com sangramento, ela caiu no banheiro e morreu, lembrou Iracema.

O caso aconteceu em 1983, na única maternidade do estado, a Mãe Luzia, segundo Iracema. A cabeleireira também engravidou quatro vezes, desde 2000, mas o atendimento não-especializado e o trauma com a maneira que perdeu a mãe teriam levado ela a ter complicações, comenta.

A coordenadora do grupo de trabalho da saúde do Imena, Suzana Pontes, afirma que uma das maiores dificuldades na rede de pública é no atendimento, principalmente relacionado à presença da informação de que a paciente é negra e/ou quilombola.

A gente tenta fazer com que o profissional passe a preencher os dados e notificações para que eles possam existir, para que a gente possa ter acesso e fazer com que essas políticas públicas existam. A partir do momento que isso falta, não tem como tratar a especificidade de cada mulher. A gente vai na maternidade e eles não têm dados ligados aos quilombolas?, comentou Suzana.

A partir dessa realidade, uma oficina reúne quilombolas, trabalhadores da saúde dessas áreas e ativistas do movimento social para entender a importância do cuidado no período de gestação e puerpério das mulheres em relação à mortalidade materna que, segundo o Imena, a partir do conhecimento empírico se entende que atinge de maneira desigual a população negra.
Com o projeto, que contou com apoio do Fundo para Equidade Racial Baobá, a ideia é avançar na aplicação das políticas públicas, na identificação precoce e tratamento apropriado paras as mulheres grávidas, para facilitar o acesso das mulheres das comunidades quilombolas ao serviço de saúde e qualificar esse atendimento.

Tudo isso, de acordo com a coordenadora do grupo de saúde, é para implementar por completo no Amapá a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, que existe no Brasil há quase 10 anos, e, assim, reduzir o índice de mortalidade materna nos quilombos amapaenses.

Ela só existe de fato em ações para doenças de anemia falciforme. E nós não somos só isso. Há um leque de vulnerabilidades, entre elas eclampsia, diabete gestacional e a hipertensão, que ocasionam a morte materna que, apesar de não ter dados, a gente observa que acontece mais frequente com negras, concluiu Suzana.

Participam dos encontros quilombolas e profissionais de 3 comunidades, do Curiaú, Tessalônica e Maruanum.

 

Fonte: Itaquera

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