22 dez

Monocultura de eucalipto impacta território quilombola Sapê do Norte no Espírito Santo

Por Maryellen Crisóstomo

Quilombolas do território Sapê do Norte localizado nos municípios de Conceição da Barra e São Mateus no Espírito Santo, enfrentam conflitos em decorrência da invasão de áreas do território tanto por pessoas físicas quanto por empreendimento de monocultura do eucalipto, cultivado pela empresa Suzano. O território tem cerca de 100 famílias quilombolas que também denunciam a escassez de água como consequência da desertificação da região para a produção de eucalipto.

Quilombos reunidos no acampamento da retomada – Foto: Selma Dealdina

O desmatamento nas proximidades das nascentes que abastecem o território compromete a produção saudável e todos os modos de vida quilombola. “Queremos nossa nascente de volta! Fizemos o pedido para a empresa para afastar pelo menos 50 metros. Tem eucalipto dentro da nossa nascente. E nós queremos a nossa água de volta porque está tudo seco. Queremos a nossa água”, enfatiza Myrian Dealdina Fontoura Faier, 30, liderança da comunidade.

No início desde ano o jornal Século Diário publicou que Suzano reclamava junto ao Estado do Espírito Santo, por meio da Federação das Indústrias, urgência na liberação de uma área de 5 mil hectares no município de Conceição da Barra para expansão do monocultivo do eucalipto.

A mesma matéria aponta ainda a existência de uma ação contra a empresa alegando a defesa dos recursos hídricos da região. “Nas redondezas, no município de Montanha, também tramita ação judicial que visa impedir a expansão dos monocultivos de eucalipto. Impetrada pela promotoria local do Ministério Público Estadual (MPES), a ação aduz que o grave déficit hídrico da região mostra a insustentabilidade do projeto da Suzano”, relata um trecho da matéria.

Quilombolas no acampamento na área de retomada. Quilombo Angelim III Foto: Selma Dealdina

A escassez hídrica é a principal demanda da comunidade que busca retomar o perímetro da nascente que atualmente se encontra na área desmatada. “O objetivo da nossa retomada é a prevenção das nossas nascentes, que acabou com nossas águas. Nós somos quilombolas e temos o direito ao território e até hoje o governo ou que seja empresa, não nos deu esse direito.” relata Manoel Fontoura, 69, liderança da comunidade.

 

Demarcação e titulação do território

 

Quilombolas da comunidade Angelim III no acampamento de retomada – Foto: Selma Dealdina

Em meio a pandemia da COVID-19 quilombolas do território Sapê do Norte passaram a enfrentar também a invasões de pessoas alheias, motivadas pela expressão “ir passando a boiada” proferida pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Sales quando questionado em entrevista sobre as mudanças nas as regras e normas que regem as questões relacionadas ao meio ambiente, agricultura e patrimônio cultural, previstas na MP da Grilagem (Projeto de Lei 2633/2020).

Sem a demarcação e titulação dos territórios, a Suzano tem impetrado e obtido êxito nas ações de despejo contra os próprios quilombolas de Sapê do Norte. Atualmente a Suzano tem a seu favor o pedido de reintegração de posse de 802 hectares, sendo que parte dessa área pertence ao território quilombola.

Segundo a coordenadora nacional da Conaq, pelo Espírito Santo, Kátia Penha, em todo o Estado há apenas um território parcialmente titulado. A morosidade do Estado brasileiro em demarcar os territórios quilombolas têm contribuído para diversos conflitos em várias partes do país.

“Na região do Sapê do Norte, entre Conceição da Barra e São Mateus, onde se concentra a maior quantidade de comunidades quilombolas capixabas, os conflitos são históricos com o monocultivo de eucalipto promovido desde a época da Aracruz Celulose, depois transformada em Fibria e comprada pela Suzano” relata a matéria do jornal Século Diário publicada nesta semana e assinada pelo jornalista Vitor Taveira.

Foto: Selma Dealdina

A área demandada pelos quilombolas que se encontram no local há mais de século visa a recuperação da nascente e produção saudável para as famílias do território. “A área que está sendo retomada não representa nem 1 por cento da área total plantada de eucalipto aqui na região. A gente está pedindo um pedaço para a reprodução. Para plantio de comida saudável e construção de casa porque as famílias estão crescendo e não para onde elas irem porque o espaço que tem não é suficiente para a quantidade de pessoas”, relata Selma Dealdina, liderança nacional e filha do território Sapê do Norte.

“É por isso que nós estamos retomando o nosso direito. O nosso povo sofre porque o território é pequeno e a família é muito grande. Nós queremos a terra para o plantio para produzir o alimento para nossa família” reforça Manoel Fontoura, liderança local.

Segundo o dado do pré-censo do IBGE, no Brasil existem 5.972 quilombos presentes em 33% dos municípios brasileiros distribuídos em 24 Estados.

 

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