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15 jul

Projeto “Conexão Povos da Floresta” proporciona conectividade para quilombolas da Amazônia Legal 

Por: Ailton Borges

 

Abordar o tema do acesso à internet como agente transformador e construtor de políticas públicas no Brasil sempre foi um desafio diário. No entanto, ao direcionarmos essas políticas para a Amazônia, em especial para as comunidades quilombolas, o desafio se amplia consideravelmente. 

Assim, o projeto “Conexão Povos da Floresta” surgiu com o objetivo de proporcionar conectividade a milhares de comunidades, dar a elas autonomia e protagonismo para fortalecer, proteger e lutar por seus territórios e ser ferramenta de transformação, permitindo o acesso a saúde, educação e oportunidades. 

Os esforços para promover justiça social e equidade nesses territórios, historicamente marginalizados e com seus direitos violados, devem ser persistentes e a falta de acesso à internet é um dos impactos sociais que ainda atingem as comunidades quilombolas na Amazônia. A barreira limita a conexão, a busca por informações e o acesso a políticas cruciais, como, saúde, educação e cultura. 

Ferramenta de luta

A era digital, quando incorporada de maneira consciente e respeitosa aos valores tradicionais das comunidades, pode impulsionar práticas sustentáveis e tornar cada quilombola um porta-voz. Além disso, a conectividade pode ser uma ponte de comunicação que irá transitar as informações relevantes para toda a comunidade, estabelecendo assim uma comunicação popular, em prol da defesa do território. A internet pode ser ainda uma ferramenta de luta e o acesso é importante para lidar com os impactos ambientais do desmatamento que afetam diretamente os quilombos.

 

De acordo com uma pesquisa realizada pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Intervozes e Movimento da Mulher Trabalhadora Rural do Nordeste (MMTR-NE), cerca de 29% dos domicílios em comunidades quilombolas do Nordeste brasileiro não têm acesso à internet. A pesquisa também revela que 33% das famílias que possuem internet em casa enfrentam dificuldades financeiras para arcar com os custos mensais desses serviços. 

Conhecendo essa realidade e a falta de políticas públicas que são essenciais para as comunidades tradicionais, o projeto Conexão Povos da Floresta surgiu com o objetivo de conectar, através de internet banda larga, mais de 5 mil comunidades indígenas, quilombolas, extrativistas e ribeirinhas em territórios protegidos da Amazônia Legal. A iniciativa é liderada pelas organizações de base Conaq, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), em parceria com mais de 30 organizações da sociedade civil, instituições e empresas. 

A iniciativa em rede realizou a fase-piloto de instalação em março de 2023, em 31 comunidades. Até o final de 2025, o objetivo é conectar aproximadamente 1 milhão de pessoas moradoras de áreas protegidas da Amazônia Legal, responsáveis por conservar 120 milhões de hectares de floresta. 

A ideia central é que a internet funcione como uma ferramenta de inclusão e transformação, permitindo o acesso a saúde, educação e oportunidades profissionais, além de fortalecer uma rede representativa das populações tradicionais. Atualmente, o projeto já alcançou mais de 900 comunidades conectadas em 234 municípios espalhados pela Amazônia Legal, o que representa cerca de 71 mil pessoas beneficiadas. 

José Carlos Galiza, coordenador executivo da Conaq e do projeto Conexão Povos da Floresta, afirma que o projeto tem objetivos amplos e não se limita em proporcionar acesso à internet rápida para as comunidades. O foco é também oferecer uma abordagem abrangente, abrindo oportunidades para formação, monitoramento territorial e acesso a políticas públicas direcionadas para os povos da floresta. 

O projeto Conexão Povos da Floresta não se resume a ser apenas um ponto de internet. Um dos nossos principais objetivos é fornecer acesso rápido à internet para as populações das florestas. No entanto, buscamos e temos alcançado impactos mais significativos. Estamos trabalhando arduamente para oferecer às comunidades acesso a cinco temas cuidadosamente definidos em colaboração com diversas organizações parceiras, através de Grupos de Trabalho (GTs) específicos. Esses temas não são apenas uma alternativa de formação; eles também desempenham um papel crucial no monitoramento territorial, contribuindo para o avanço de políticas que atendam às demandas específicas dos povos das florestas”, afirma Galiza. 

Letramento digital 

O acesso à informação tornou-se um pilar de extrema importância. Diante disso, destaca-se a importância de também desenvolver estratégias que ofereçam formações sobre o uso responsável das tecnologias, a fim de evitar a propagação de fake news. Essa abordagem educacional é fundamental para capacitar as comunidades a discernir informações confiáveis, promovendo um ambiente digital saudável e seguro para o uso responsável e de compartilhamento de informações. 

Galiza destaca o letramento digital como um dos cinco temas pensados para oferecer alternativas de formação às comunidades beneficiadas. 

“O projeto tem se preocupado não apenas em proporcionar o acesso à internet, mas também em orientar sobre como utilizar essa ferramenta essencial. Introduzimos a trilha de letramento digital, ou o curso de Sabedoria Digital, como alguns o conhecem, que tem com um dos seus principais eixos, levar formação aos povos das florestas, oferecendo informações online-, sobre segurança digital. Abordamos temas relacionados ao uso consciente de aplicativos, destacando a importância de proteger dados pessoais, bem como os de terceiros. Buscamos promover um letramento digital e uma educação online que capacitem as comunidades a navegarem de maneira segura e informada no mundo virtual”, explica Galiza. 

O letramento digital vai além e ajuda ainda no processo de formação profissional, social, econômico e cultural. Um exemplo é o acesso ao nível superior. Através da conexão rápida, e do letramento digital, o Conexão Povos da Floresta permite que adolescentes, jovens e adultos consigam ter uma educação de qualidade e se preparem para entrar na universidade. 

Silvandro Fernandes Pinheiro, de 41 anos, liderança do quilombo de Providência, em Salvaterra (PA), por exemplo, conta que por muito tempo ficou sem perspectivas, mas o projeto lhe deu forças para voltar a estudar.  

Essa experiência me mostrou que a internet pode ser uma ferramenta importante para nós. As videoaulas foram decisórias para o meu futuro hoje. Quando iniciou o Processo Seletivo Especial para Indígenas e Quilombolas (PSE), me dediquei ainda mais. Decidi, juntamente com minha esposa, retomar os estudos para ingressar na universidade. O acesso à internet proporcionado pelo projeto Conexão Povos da Floresta foi essencial para estudar online. Com dedicação, fui aprovado e ingressei na UFPA [Universidade Federal do Pará] no curso de Geoprocessamento, e como resultado fiquei careca”, afirma Fernandes. 

Monique Guerreiro Galiza, que é articuladora do projeto Conexão Povos das Floresta pela Conaq, fala da importância que o projeto tem para as comunidades quilombolas e na formação. 

“Acredito que levar o projeto Conexão Povos da Floresta para a nossa juventude quilombola é uma excelente iniciativa. O projeto conta com diversos parceiros, incluindo a Fundação Roberto Marinho, Recode e Nic.br, proporcionando acesso a comunicações que anteriormente pareciam quase impossível. O projeto trouxe consigo uma formação valiosa, e é uma oportunidade de capacitar as pessoas que residem nesses territórios, muitas vezes dependentes de pontos de acesso mantidos por pessoas aposentadas ou com alguma renda na prefeitura local. A iniciativa é surpreendente, não apenas pela conectividade que oferece, mas também pelo empoderamento educacional que proporciona a esses membros essenciais de nossas comunidades”, relata Monique. 

Adimar Castro, quilombola e morador do quilombo Poacê, localizado no município de Monu (PA), e técnico do projeto Conexão Povos da Floresta pela Conaq, conta que quando a discussão sobre a implementação da internet 5G no Brasil começou, o grupo já estava atento a essa questão nas interações com as bases e organizações. A preocupação era com a exclusão das comunidades tradicionais, quilombolas, indígenas, ribeirinhos e extrativistas, do mapa de cobertura e implementação do 5G. 

“A partir desse ponto, surgiu a ideia de ir além da simples entrega da internet às comunidades. Pensamos em como as comunidades poderiam tirar o melhor proveito disso. Trabalhamos em parceria com diversos parceiros para desenvolver trilhas e grupos de trabalho (GTs) dentro do projeto. O foco dessas iniciativas é discutir como as comunidades podem aproveitar essa conectividade de maneira mais eficaz”, relembra ele. “ 

Partindo de todo esse caminho, surgiu a necessidade de criação e fortalecimento dos Grupos de Trabalho (GTs) do projeto Conexão Povos da Floresta, divididos nos temas de Saúde, Educação, Proteção Territorial, Empreendedorismo e Cultura e Ancestralidade. Os GTs são responsáveis por potencializar a conectividade como ferramenta de inclusão e empoderamento das comunidades 

O GT de Educação, por exemplo, vem tendo grandes avanços, com mais de 100 alunos inscritos e conectados na formação de Sabedoria Digital, e conforme a demanda vem crescendo, se cria novas turmas. O objetivo é conscientizar a população tradicional sobre como utilizar a internet de forma segura e eficiente, promovendo um ambiente educacional e conectado”, completa Adimar.

O Conexão Povos da Floresta possibilita também a implementação de oficinas e cursos dentro das comunidades, criando um espaço de conhecimento que antes parecia uma realidade distante para os quilombolas, como é o caso do curso de informática.  

Flávio Sanches, quilombola do Quilombo de São José, localizado no município de Acará (PA) e facilitador do projeto-, pela Conaq, teve a iniciativa de desenvolver o curso para os moradores de sua comunidade.  

“O projeto me deu a possibilidade de lecionar aulas de informática dentro da comunidade, pois a gente não tinha acesso à internet. Essa liberdade; de estar trabalhando com os jovens e ajudando eles a construir um futuro promissor para que possam juntos nos ajudar dentro dos nossos quilombos; é enriquecedora para mim e para o nosso quilombo”, afirma Flávio. 

Adimar Castro, fala ainda sobre a trilha de empreendedorismo do projeto dentro dos territórios, que busca fortalecer os empreendedores locais. 

“Essa trilha oferece formação para os nossos empreendedores que vivem e são dos nossos territórios para divulgarem e aprimorarem seus produtos e verem a melhor forma de ecoar seus negócios dentro da comunidade. Trabalhamos e construímos em conjunto com as comunidades, diariamente dialogando com todos para identificar as suas demandas, negócios e produções. Essa trilha se preocupa constantemente com a formação das comunidades, construindo estratégias e recursos para materializar materiais de qualidade e promover resultados produtivos para os empreendedores que estão ali diariamente dentro da base que dependem da terra e de seus cultivos”, explica ele. 

O projeto também desempenha um papel importante na preservação da Floresta Amazônica e no combate ao desmatamento e expansão de atividades como pecuária, plantações de soja, garimpos ilegais e exploração desenfreada de recursos naturais. 

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam uma realidade triste para a Amazônia e todos povos que vivem e lutam por esse bioma. Entre 2000 e 2020, o Brasil perdeu 513,1 mil km² de áreas verdes, representando 6% do território nacional ou o equivalente a quatro estados combinados: São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Sergipe. 

Para ajudar na proteção desses territórios, Galiza destaca a trilha da Proteção Territorial e de como ela poderá combater o desmatamento. “O GT de Proteção Territorial; é uma espécie de canal de denúncia, em que a comunidade possa ter um instrumento de defesa e uma plataforma para pedir ajuda no caso de que haja um agravo ambiental”. 

O desmatamento provoca impacto direto no meio ambiente e na agricultura familiar, que é uma importante política de renda e possibilita que quilombolas que dependem da floresta em pé possam viver e ter alimento em suas mesas. O empreendedorismo quilombola permanece sub-representado nas políticas públicas, enquanto alguns empresários buscam lucrar nos territórios quilombolas. Por meio do projeto, realiza-se formação para empreendedores das florestas que dependem de seus territórios para sobreviver e o GT de Empreendedorismo assume um papel crucial na missão de empoderamento e mapeamento de oportunidades.