Os argumentos da juíza para condenar Bolsonaro por ofensa aos quilombolas

Nem piada nem direito à liberdade de expressão: sentença rejeita todos os pontos da defesa
Na peça, presidenciável diz “não ter preconceito” contra grupos que também ataca, como mulheres

As declarações que Jair Bolsonaro (PSC-RJ) costuma dar em público levaram a uma nova condenação do deputado por danos morais. Desta vez, a Justiça do Rio de Janeiro determinou que Bolsonaro, pré-candidato à presidência da República que tem na retórica inflamada e no escárnio contra minorias também uma estratégia de conquistar eleitores, pague 50.000 reais de indenização à população quilombola e à população negra em geral depois de ter dito que quilombolas “não servem nem para procriar” durante uma palestra no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, em abril.

Jair Bolsonaro na Câmara.

As declarações que Jair Bolsonaro (PSC-RJ) costuma dar em público levaram a uma nova condenação do deputado por danos morais. Desta vez, a Justiça do Rio de Janeiro determinou que Bolsonaro, pré-candidato à presidência da República que tem na retórica inflamada e no escárnio contra minorias também uma estratégia de conquistar eleitores, pague 50.000 reais de indenização à população quilombola e à população negra em geral depois de ter dito que quilombolas “não servem nem para procriar” durante uma palestra no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, em abril.

Mas, para a juíza Frana Elizabeth Mendes, o deputado “tem o dever de assumir uma postura mais respeitosa com relação aos cidadãos e grupos que representa, ou seja, a todos, haja vista que suas atitudes influenciam pessoas, podendo incitar reações exageradas e prejudiciais à coletividade.” E aponta “total inadequação da postura e conduta praticada” pelo deputado. Mendes ainda que não há vestígio de perseguição política na acusação e refuta a questão da imunidade: “A aludida prerrogativa de imunidade parlamentar não se estende a palavras (…) que ofendam, ridicularizem ou constranjam pessoas, grupos ou comunidades, como se verificou nas manifestações proferidas pelo réu, não só contra os grupos quilombolas, mas a outros, os quais, no entanto, não foram objeto de discussão nestes autos”.

A juíza argumentou que o deputado tem toda a liberdade para criticar legislação como demarcação de terras indígenas ou quilombolas, mas, em sua visão, não foi isso que o deputado fez: “O réu não expôs simplesmente que discorda da política pública que prevê gastos com o aludido grupo, mas inegavelmente proferiu palavras ofensivas e desrespeitosas, passíveis de causar danos morais coletivos”.

Penalidade e candidatura em 2018

É ao menos a segunda vez nos últimos meses que Bolsonaro é punido por seu discurso. Em agosto, ele foi condenado a pagar 10.000 reais à deputada Maria do Rosário (PT-RS) por ter dito a ela que não a “estupraria” porque ela “não merecia”. É pelo mesmo episódio que o deputado do Rio é réu em uma ação criminal por incitação ao crime de estupro e injúria, que corre no Supremo Tribunal Federal desde o ano passado.

As condenações de Bolsonaro na Justiça ou mesmo uma possível condenação no STF não são capazes, porém, de impedir que ele concorra nas eleições de 2018. Um dos principais nomes na disputa eleitoral para a presidência, o deputado não ficaria implicado na Lei da Ficha Limpa porque esta legislação não se aplica a casos na esfera cível. A Lei da Ficha Limpa diz que ficam inelegíveis políticos condenados apenas no âmbito criminal.

Nem mesmo uma possível condenação no STF na ação criminal pelo mesmo caso teriam potencial para impedi-lo de concorrer em 2018. Isso porque os crimes de injúria e incitação ao estupro não estão tipificados na Lei da Ficha Limpa. “A reforma na lei da ficha limpa só prevê a impossibilidade de concorrer em crimes específicos, esse não é o caso”, disse ao EL PAÍS Ivar Hartmann, professor de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em agosto. Entres os crimes específicos da Lei da Ficha Limpa, estão delitos contra a administração pública e o patrimônio público, tráfico de drogas e racismo.

Indenização menor

A nova ação contra o deputado foi ajuizada pelo Ministério Público Federal que pediu uma indenização de 300.000 reais a ser revertida em projetos de valorização da cultura e história dos quilombos. Quem deverá fazer a indicação dos projetos é a Fundação Cultural Palmares, responsável por emitir o certificado de reconhecimento das comunidades quilombolas.

Porém, a juíza reduziu este valor para 50.000 reais. “Estamos esperando a intimação para analisar se vamos recorrer em face de o valor ser menor do que o pedido”, afirmou o procurador-chefe da Fundação Palamres, Jonas Rodrigues. Procurada, a assessoria de imprensa do deputado não atendeu à ligação e não respondeu à mensagem da reportagem, mas, de acordo com o jornal O Estado de São Paulo, a defesa de Bolsonaro vai recorrer.

Atualmente, existem cerca de 3.000 comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Palmares. O certificado é a primeira forma de reconhecimento dado aos povos quilombolas. Quando uma comunidade recebe a Certidão de Autodefinição de Comunidade Remanescente de Quilombo, ela passa a ter direitos e amparos legais, previstos na Constituição, para a valorização e proteção do patrimônio cultural. Posteriormente, o Incra realiza a demarcação das terras.

https://brasil.elpais.com/brasil/2017/10/04/politica/1507147016_167469.html

Share This