29 set

Famílias do Quilombo Camarinha, em Mato Grosso, comemoram decisão judicial preliminar favorável à comunidade

Por: Letícia Queiroz

Uma decisão judicial preliminar favorável à comunidade quilombola Camarinha, que fica entre os municípios de Barra do Bugres e Porto Estrela, no Mato Grosso, traz esperança de dias melhores para as famílias quilombolas da região. O documento informa que a União deve dar continuidade ao processo de titulação de território quilombola. A decisão do juiz federal Francisco Antônio de Moura Júnior foi tomada como medida de urgência para evitar danos à comunidade até que haja a decisão final.

No território há 34 famílias e a constituição do quilombo com a presença das primeiras famílias no território começou em 1885. Apesar de não se tratar do título definitivo, a Coordenação Nacional de Articulação de Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), os quilombos de Mato Grosso e lideranças de todo o Brasil comemoram, já que nos últimos seis anos os processos envolvendo a regularização de comunidades quilombolas ficaram parados.

Maria Helena, coordenadora estadual da CONAQ no MT, explica que no estado não há histórico de territórios quilombolas titulados pelo Incra e os processos se arrastam por vários anos. Por isso, a decisão é considerada um avanço significativo.

“Essa é uma grande vitória para os grupos familiares quilombolas que há muitos anos lutam para o reconhecimento como proprietários legítimos dessa região. Já é uma grande vitória. Festejamos aos bravos guerreiros quilombolas que foram tombados ao longo dos tempos e aos novos e novas guerreiras que bravamente vem lutando e conquistando vitórias com parceiros significativos como a CONAQ. Todo esse território há muitos anos vinha sendo habitado por nossos ancestrais e por várias famílias quilombolas que resistem dentro e fora do grande espaço do território”, afirmou Maria Helena.

A coordenadora explica que a titulação definitiva é muito esperada pela comunidade. “Titular os nossos territórios quilombolas é questão de respeito e reparação histórica de toda uma sociedade. A titulação quilombola é a força que rege todas as estruturas do nascimento até o falecimento de um quilombola. É a ferramenta de poder, de identidade, de pertencimento étnico e primordial para nos sentirmos parte da sociedade que constitui essa nação”, disse.

Local onde moram quilombolas de Camarinha atualmente

Uma pessoa do quilombo Barra do Bugres, que não será identificada nesta reportagem, disse este é um processo que se estende por anos e que a liminar é uma grande conquista para os moradores. “Significa que podemos ocupar o nosso espaço, o nosso território, e dessa forma poderemos trabalhar tranquilamente sem ameaças de expulsão. Para todos significa dar continuidade à nossa tradição, a nossa cultura, a uma luta que se entende por anos e que resistimos até agora”, disse.

Durante todos esses anos o território foi invadido por diversas pessoas que queriam tomar posse do espaço que pertence ao povo quilombola que luta, mantém as tradições e guarda memórias de saberes e fazeres quilombolas.

 

Vercilene Dias, quilombola e advogada, Coordenadora do setor jurídico da CONAQ, explica que os próximos passos devem ser o cumprimento das decisões até chegar uma decisão final. Ela explica que o Estado precisa garantir a titulação dos territórios quilombolas. “É um dever do Estado fazer isso. E a sentença é um presente bacana no sentido de reconhecer a vulnerabilidade das comunidades quilombolas e a legitimidade dos direitos das famílias que vivem nos quilombos”, afirmou Vercilene.

A coordenadora estadual da CONAQ afirma o título definitivo é a maior conquista desta e de todas as comunidades quilombolas do Brasil.

“Significa, paz, liberdade, respeito, cidadania. Tudo isso vem com o título definitivo do nosso território quilombola, sem a garantia do Título definitivo tudo é vago e se perde em promessas. Queremos proteção, autonomia, participação ativa nas tomadas de decisões que atinge diretamente nossa população quilombola. Isso é definitivamente importante para deixarmos de ser meros coadjuvantes dos nossos saberes, fazeres, vozes, memórias, escritas e outros, para nos tornarmos atores e protagonistas das nossas vidas, sonhos, interesses coletivos e escrevivências”, afirmou Maria Helena.

As lideranças afirmam que a busca por reparação histórica continua.

“Homens e mulheres buscam por uma reparação histórica que até os dias de hoje manteve nosso povo quilombola na invisibilidade social. Mas a memória dos nossos ancestrais não serão apagados. Sonhamos com um futuro melhor para nossas futuras gerações”, finalizou a pessoa quilombola não identificada.

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