Carta das Mulheres Quilombolas do Estado do Espírito Santo
Nós mulheres quilombolas do Espírito Santo reunidas nos dias 13 e 14 de outubro de 2017 em São Mateus no “Seminário de mulheres quilombolas: a história que queremos contar- territórios livres de petróleo” vimos a público nos manifestar.
Pela defesa do Decreto 4887/03 que nos dá amparo ao processo institucional de regularização dos nossos territórios e portanto a garantia para ir e vir, produzir, criar nossos filhos, nossos animais, cuidar das nossas águas e alimentos… Porém este Decreto, que foi uma declaração de amor para os quilombos do Brasil, está ameaçado com a votação pelo STF da Ação Direta de Inconstitucionalidade movida pelo PFL/DEM em 2004. Contrariando a Convenção 169 da OIT, este julgamento questiona o nosso direito primordial a auto-identificação e nossos direitos territoriais. Precisamos dele para garantir a permanência nos nossos territórios de origem e reconstruir nosso horizonte de vida. Isto não poderia ser julgado, ao contrário deveria ter força de lei.
Mesmo com este Decreto o índice de violência contra nós está alarmante. Só este ano 19 lideranças quilombolas foram cruelmente assassinadas no Brasil. A violência vem desde fazendeiros confrontantes com nossos territórios, até o próprio governo que não nos defende e se omite diante destes conflitos, passando também pelos grandes projetos industriais que invadem nossos territórios quilombolas.
No Espírito Santo, identificamos conflitos com empresas de celulose, de cana e petroleiras. Sem respeitar o direito a consulta prévia, livre e informada estes grandes projetos industriais querem nos sacrificar em nome de um desenvolvimento. Vendem ilusões de empregos e falsas promessas que não vão nos impactar, mas não é isso o que vemos. As petroleiras por exemplo, perfuram nosso subsolo com inúmeros poços, rasgam áreas sagradas com dutos, contaminam a terra e água com vazamentos constantes, põe em risco a segurança das mulheres com a vinda de vários trabalhadores de fora, nossa segurança alimentar com a redução de nossas áreas produtivas, empobrecem as famílias e a região e escondem as violações de direitos que geram com projetos de compensação .
Pelo direito de dizer Não, nós mulheres exigimos que nossos territórios sejam respeitados, nossa opinião seja ouvida, nossos projetos sejam implementados, nossa cultura e história seja valorizada.
Juntas, dizemos Sim a vida livre para os territórios quilombolas!
NEM UM QUILOMBO A MENOS!
NEM UM POÇO A MAIS!
Assinam:
Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ
Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas Zacimba Gaba – COEQ
Associação de Pequenos Agricultores Rurais quilombolas de Divino Espírito Santo/São Mateus
Associação de Pequenos Produtores Rurais Quilombolas do Córrego de Cacimbas e São Domingos de Itauninhas/São Mateus
Associação de Pequenos Produtores e Moradores Quilombolas de Nova Vista/São Mateus
Associação quilombola de Dilô Barbosa/São Mateus
Associação dos Pequenos Agricultores Moradores Quilombola de Roda D´Água/Conceição da Barra
Associação das Mulheres Quilombolas da Comunidade de Linharinho/Conceição da Barra
Associação Quilombola da Comunidade de Serraria e São Cristóvão/São Mateus
Associação Quilombola da Comunidade de Santa Luzia/ Montanha
Associação Quilombola da Comunidade São Jorge/São Mateus