16 dez

AGROPALMA vs. QUILOMBOLAS DA ARQVA

 

Por Mayara Abreu

Fotos: Divulgação/Malungu

Por determinação judicial expedida na última quinta-feira (15), os quilombolas e indígenas Tembé, do Território da Balsa, Turiaçu, Gonçalves e Vila Palmares do Vale do Acará – ARQVA, tem o prazo de até 48 horas para desocupar a área de ocupação, mais especificamente, na fazenda Roda de Fogo, onde a Agropalma tem a posse, no entanto, segundo decisão judicial, são terras públicas do Estado, mesmo assim, continuam controladas pela empresa.

Ainda de acordo com a determinação do Juiz Dr André Luiz Filo-Creão G. Fonseca, caso não haja cumprimento espontâneo dos termos previstos no acordo, fica consignado a reintegração de posse, a ser executada pelo Comando de Missões Especiais da Polícia Militar.

Após recomendação do jurídico da Coordenação das Associações Quilombolas do Estado do Pará (MALUNGU), os quilombolas e indígenas que estão ocupando a área, até então, encontram-se irredutíveis, fazendo com que a situação se agrave. Importante pontuar, que a comunidade tem autonomia para tomar suas próprias decisões, ou seja, a malungu, neste caso, pode apenas orientar e fazer recomendações de acordo com as questões legais.

De acordo com informações de lideranças, a ocupação se deu, após a Agropalma ter desrespeitado acordos firmados em juízo, que violam a subsistência dos quilombolas e indígenas da região como, a proibição de caçar e pescar, contaminação dos rios, lagos e igarapés, decorrentes ao despejo de veneno aplicados pela referida empresa na plantação de dendê.

As violações territoriais e a negação de direitos por parte do estado são alguns dos principais fatores de conflitos nos territórios. Com isso, reiteramos a importância da Titulação e garantia da proteção dos quilombos.

“O que falta realmente, é uma reforma agrária preta e que leve em consideração a população negra quilombola da Amazônia, pois, para que a gente continue garantindo a floresta em pé e a vida dessa população que é diversa e muito importante para o Brasil, é necessário que se titule com urgência para que assim se cumpra a legislação existente no país”, enfatizou o Coordenador da Coordenação Nacional das Articulações Negras Quilombolas (CONAQ), José Carlos Galiza.

Quilombola e indígenas no local da área que será reintegrada à Agroplama | Foto: Dilvulgação Malungu

 

Release

Na última quinta-feira (15), a Vara Agrária da comarca de Castanhal-PA, realizou, na Câmara Municipal de Acará, nova audiência de conciliação para pacificar conflito agrário entre a empresa Agropalma e a Associação de Ribeirinhos e Quilombolas Agricultores Familiares Pescadores do Vale do Acará (ARQVA). A audiência é decorrente do pedido de reintegração de posse ajuizada no último dia 12 deste mês pela empresa AGROPALMA, após quilombolas e indígenas terem (re)ocupado área de pretensão dos dois grupos étnico-raciais.

A ARQVA é representada no processo pela Defensoria Pública. A Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará (MALUNGU) foi aceita como amicus curiae e é representada pelo seu corpo jurídico, composto por advogados(as) quilombolas egressos do curso de Direito da UFPA.

Em 2016 a MALUNGU, por meio de sua assessoria jurídica, solicitou ao ITERPA a instauração de processo administrativo para regularização da área pretendida pela ARQVA, com base na legislação federal e estadual que garante o direito de propriedade coletiva das comunidades quilombolas. O processo administrativo foi instaurado sob o nº 2016/330821.

A (re)ocupação ocorreu porque, segundo informações de lideranças quilombolas da ARQVA, a empresa Agropalma tem desrespeitado os acordos anteriores firmados em juízo. Esses desrespeitos violam direitos humanos imprescindíveis à subsistência de indígenas e quilombolas que moram naquela região. Entre essas violações está a proibição de caçar e pescar, a contaminação de rios, lagos e igarapés pelos venenos aplicados pela referida empresa na sua plantação de dendê.

Importante destacar que, na década de 1980, muitas comunidades quilombolas do Vale do Acará sofreram processo de desterritorialização por meio da expropriação forçada, devido ao avanço da monocultura de Dendê sobre tais comunidades. Hoje essas áreas são reivindicadas por indígenas e quilombolas da ARQVA.

O processo (principal) de reintegração / manutenção de posse foi ajuizado pela Agropalma em fevereiro de 2022, desde então esse já o terceiro acordo firmado em juízo.

A área de posse da empresa sobrepõe cerca de nove (9) mil hectares de território reivindicado e tradicionalmente ocupado por quilombolas das comunidades da Balsa, Turiaçu, Palmares e Gonçalves, que como dito antes sofreram expropriação na década de 1980. Essa área, segundo decisão judicial, são terras públicas do Estado, contudo, continuam controladas pela empresa Agropalma.

Cabe enfatizar que a ARQVA recorreu ao Projeto Nova Cartografia da Amazônia do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará (NAEA/UFPA), que realizou estudo sobre a área de pretensão quilombola, o qual foi coordenado pela renomada antropóloga Dra. Rosa Elizabeth Acevedo Marin. Esse estudou conclui pela condição quilombola dos habitantes da área pretendida pela ARQVA.

Nessa área de conflito agrário existem quatro cemitérios sitiados pelas fazendas da Agropalma, sendo três de quilombo e um dos indígenas.

 

Entenda o caso

 

No dia 27 de julho de 2021, o Tribunal de Justiça do Pará (TJE/PA) determinou, por meio de sentença, que a Agropalma retirasse 35 mil hectares do seu patrimônio, após denúncias de fraudes praticadas pela referida empresa, que estaria envolvida em um esquema de grilagem de terras e irregularidades nas cadeias dominiais.

Em novembro deste ano, após denúncia de comunitários indígenas e quilombolas de que a empresa Agropalma estava cometendo crimes ambientais com derramamento de efluentes (tibórnia) no Igarapé Cariateua, localizado na área de pretensão quilombola, técnicos da SEMAS foram realizar a vistoria na área alvo da denúncia. Tal procedimento administrativo foi autorizado pela Portaria de Viagem n° 2749/2022 – GAB/SEMAS.

Essa vistoria é apresentada no Relatório Técnico (RT) Nº: 17708/GEIND/2022, o qual foi requerido pelo Ministério Público Estadual por meio do Ofício nº 116/2022-NAF-MPPA, da Promotoria de Justiça Agrária da 1ª Região.

No Relatório a equipe técnica da SEMAS concluiu, afirmando, categoricamente, que houve o despejo/derramamento de efluentes industriais no Igarapé Cariateua, com potencial contaminação e/ou poluição deste corpo hídrico, prejudicando a vida aquática e os diferentes usos pelas comunidades ribeirinhas, configurando assim em crime ambiental, além de outras infrações, tais como a construção de valas no final do terreno de plantio de dendê na área fertirrigada e o agravante de impedir os servidores desta SEMAS em acessar as dependências da empresa para averiguação das denúncias. Deve-se ainda solicitar da empresa o Licenciamento Ambiental da construção de uma ponte que vem sendo feito sobre o igarapé Cariateua; apresentar explicações sobre a inconsistência na geração anual de efluentes pelas agroindústrias AGROPALMA/PARAPALMA, pois para aprovação do projeto de fertirrigação pela Nota Técnica n° 21956/GEIND/CIND/DLA/SAGRA/2020, foi apresentado 71.643,47 m3 / ano e no projeto de compostagem, Documento nº 2022/33331, foi de 508.381 m3 /ano e reapresentar o projeto de compostagem, Documento nº 2022/33331, na versão em Português. Neste sentido, esta equipe técnica sugere a SUSPENSÃO da análise do Documento nº 2022/33331, que apresenta Projeto de Compostagem, em atendimento a Condicionante 01 (180 dias)Para Fertirrigação e da Licença de Operação nº 2021/12662, bem como o encaminhamento para providências junto a Diretoria de Fiscalização (DIFISC) – (RELATÓRIO TÉCNICO Nº: 17708/GEIND-SEMAS/2022, p. 5-6).

Entre os termos do novo acordo judicial, está a criação de um grupo de whatsapp com a finalidade de que ali seja reportada toda e qualquer situação de divergência na execução do acordo, a fim de evitar possíveis tensionamentos entre as partes durante a execução da avença. Fazem parte desse grupo representantes do MPE, DPE, AGROPALMA, ARQVA e MALUNGU.

 

 

 

Share This