16 de dezembro de 2024
Quilombo São Pedro, no Vale do Ribeira-SP, celebra formação de novas(os) graduadas(os)
Quilombo São Pedro celebra primeira defesa de TCC em sua comunidade e projeta futuro na academia.
“As nossas crianças estão saindo dos quilombos para estudar. Eles estão aprendendo mas também estão levando muito conhecimento para a própria universidade” Aurico Dias- Quilombo São Pedro
Os dias 13 e 14 de dezembro de 2024, sexta e sábado, entram para a história não só dos Quilombos São Pedro e Maria Rosa, mas para as comunidades quilombolas do Vale do Ribeira. A comunidade recebeu, pela primeira vez, o seminário de defesas de Trabalho de Conclusão de Curso de parte dos graduandos do curso de Licenciatura em Educação do Campo, da Universidade Federal do Paraná, campus Litoral.
Para o professor Lourival Fidélis, da UFPR, “A importância da UFPR dentro de uma comunidade quilombola está radicada na necessidade da universidade estar presente dentro das comunidades e não só a comunidade dentro da universidade; é os dois juntos, é romper de muros da universidade para as comunidades tradicionais estarem cada vez mais, em número, dentro da universidade fazendo cursos superior”, afirmou Fidelis.
A atividade foi realizada de forma mista com a participação remota de alguns docentes em algumas bancas. Já presencialmente, acompanharam os trabalhos os professores Lourival Fidélis, Adalberto de Paula, Gilson Dahmer e Marcelo Varella. Fizeram parte dos arguições, pesquisadores e pesquisadoras da Universidade Federal do Paraná, UFSCAR, UNIMEP e USP, além de mestres e mestras do saber quilombola, convidados às mesas para avaliarem, também algumas pesquisas.
Ao todo 7 graduandos e graduandas realizaram a defesa de suas pesquisas perante os pais, mães, avós, avôs, tios, tias, primas, primos, filhos e filhas e comunidade em geral, durante a tarde e noite da sexta-feira e o dia todo do sábado. Essa atividade, para nós “é um grande exemplo, que nunca teve aqui dentro do Quilombo São Pedro. É a primeira e que não seja a derradeira, que sejam muitas dessa e que nossos filhos, netos e bisnetos possam também cursar uma faculdade”, pontuou Elvira Morato- Quilombo São Pedro.
A jovem Niceia da Prata Santos, do Quilombo Maria Rosa, é a primeira pessoa de sua comunidade a realizar curso superior, em mais de um século de existência do seu quilombo. Ela teve o Calendário Cultural das Tradições no Quilombo Maria Rosa como tema de sua pesquisa. Os demais temas estudados foram o Grupo Cultural Puxirão Bernardo Furquim como percursor de educação quilombola, por Elizete de França Dias; Intersecção entre gênero, racismo e educação, a partir de narrativas de mulheres quilombolas, por Letícia Ester de França; Plantas Medicinais e suas práticas de uso no Quilombo São Pedro, por Aluísio de França Dias; Reflexões sobre a importância de um Paiol de agrobiodiversidade no Quilombo de São Pedro- Eldorado-SP, por Daniela Joana de França; conhecimentos sobre abelhas nativas no território quilombola São Pedro, por Fábio de França Marques e alfabetização de criança quilombola durante a pandemia, por Edmara de França.
Sobre essa relação de temas ligados às comunidades quilombolas estarem no espaço acadêmico, o universitário Aluisio de França Dias, do Quilombo São Pedro defende que “…é importante para a gente estar levando nossos saberes para esse espaço [universidade] e ocupando cada vez mais, podendo usufruir daquilo que nos foi negado e tirado de nós há décadas e anos”, disse Dias.
Essa turma do curso de licenciatura em Educação do Campo, da UFPR, foi nomeada Vandir de França, em homenagem ao líder comunitário do Quilombo São Pedro, por seu protagonismo na luta pelo território e organização comunitária. Outras características do curso são o sistema de alternância, onde discentes têm o Tempo Universidade e o Tempo Comunidade; e a descentralização do campus, onde as aulas, não necessariamente ocorrem dentro do campus Litoral, no município de Matinhos (PR). Essa turma frequentou as atividades do Tempo Universidade na Escola Latino-Americana de Agroecologia (ELAA), localizada no assentamento Contestado, comunidade do MST, no município da Lapa, no estado do Paraná.
Em 2025 teremos duas turmas de licenciatura realizadas aqui na região. A Licenciatura em Educação do Campo- Ciências da Natureza, ofertada pela Universidade Federal do Paraná e a Licenciatura em Educação Escolar Quilombola – Pedagogia, ofertada pela Universidade Federal de São Carlos(UFSCAR). Ambas as instituições, em parceria com a Coordenação Estadual de Quilombos (CONAQ-SP), associações quilombolas, movimentos indígenas e caiçaras, já realizaram os processos seletivos e estão em fase de matrícula das pessoas selecionadas. As turmas ocorrerão no Quilombo André Lopes, no município de Eldorado (SP).
No Quilombo São Pedro a festa se estendeu pela noite do sábado. As pessoas foram contribuindo com o churrasco, que ao som do forró coroou a diversão. A comunidade não celebra hoje somente Aluísio, Dani, Edimara, Nicéia (do Quilombo Maria Rosa), Elizete, Letícia e Fábio, mas todas e todos os que lutaram pela nossa inserção na academia, nas escolas e tantos outros espaços historicamente negados a nós, população preta quilombola. Vó… vô, estamos chegando lá!
*Luiz Ketu – Luiz Marcos de França Dias é quilombola da comunidade São Pedro, localizada no Vale do Ribeira, no estado de São Paulo. É capoeirista e coordenador do Ponto de Cultura Puxirão Bernardo Furquim. É docente de escola pública, graduado em Letras e Pedagogia, mestre em Educação(UNIMEP), doutorando em Educação (UFSCAR) e bolsista CAPES. Pesquisador e escritor.
Texto por Luiz Ketu, publicado às 12:11:35
Categoria: Educação