27 de setembro de 2024
Governo Federal e quilombolas entram em acordo para titulação dos territórios de Alcântara (MA)
21 títulos de domínio e 11 decretos de interesse social também foram concedidos a comunidades de 9 estados
“Resistência quilombola, nenhum quilombo a menos”, essa importante frase de ordem carregada de um peso inimaginável foi proferida pela Coordenadora Nacional da CONAQ, Maria do Socorro Nascimento na última quinta-feira (19), em Alcântara, no Maranhão, durante um momento histórico.
Com a presença do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Governo Federal concedeu a entrega dos títulos de domínio na cidade onde os quilombolas se mostraram aguerridos durante mais de quatro décadas assegurando o que é seu por direito.
No dia em questão, foram assinadas duas portarias e um decreto designando a população da região 78,1 mil hectares. A partir dessas determinações agora será possível realizar a desapropriação de áreas privadas sobrepostas para, em seguida, realizar de fato a titulação, que corresponde à última etapa do processo de regularização.
Além da documentação referente aos povos da cidade maranhense, foram assinados 21 títulos de domínio aos quilombolas de todo Brasil e 11 decretos de interesse social, que é uma das fases rumo à titulação dos territórios. O ato assegura a garantia de direitos a 4,5 mil famílias, com a destinação de mais de 120 mil hectares para 19 comunidades de nove estados.
A cerimônia foi marcada pela presença massiva e cativante dos cidadãos, cujo 84,6% são autodeclarados quilombolas, fazendo da região a maior em proporção de população em suas 152 comunidades e cerca de 3.350 famílias.
Antes de comparecer no evento, Lula e demais autoridades foram até a comunidade quilombola de Mamuna. Em sua passagem ele aproveitou para conversar com moradores e conheceu um pouco do dia a dia de alguns dos cidadãos.
Alguns integrantes da CONAQ também não deixaram de comparecer ao evento que representa um passo crucial rumo à titulação de todas as comunidades que estão espalhadas pelos quatro cantos do Brasil. Na ocasião, os mesmos não deixaram de externar sua alegria com esse marco, e um deles é, justamente o representante do Maranhão:
“Gostaríamos de ter vivenciado bem antes! Alcântara celebra um momento histórico na luta pelo domínio dos Territórios Quilombolas, isso mostra o quão importante é o movimento social e quilombola está unidos. Esse resultado de hoje é fruto das diversas incidências políticas da CONAQ, ACONERUQ ATEQUILA, MAB e outros movimentos de defesa dos defensores e defensoras de direitos humanos. Finda o fim de uma luta histórica e acredito que a efetivação das políticas públicas nos territórios quilombolas de Alcântara será prioridade a partir de agora”, afirmou Celso Isidoro Araújo Pacheco, Secretário e Coordenador Executivo de Juventude Quilombola da CONAQ.
Além do representante do estado, outro que fez questão de falar sobre esse momento que representou mais um passo crucial rumo à garantia dos direitos de todos os quilombolas foi o Coordenador Nacional, Maximino Silva.
“O momento da entrega de títulos de territórios quilombolas, ocorrido na última quinta feira, (19/09), em Alcântara, no estado do Maranhão é de grande relevância para a garantia do direito do acesso a terra, e a manutenção e sobrevivência das comunidades quilombolas, pois trata-se de uma reparação histórica para essa população, e é resultado de lutas de anos. A partir da conquista de seu território, as famílias poderão reivindicar políticas públicas que possam desenvolver suas comunidades, com respeito ao seu modo de vida, organização, identidade e ancestralidade. Nessa luta a CONAQ tem batalhado incansavelmente junto às comunidades quilombolas para a garantia desse direito. Outro fato importante ocorrido, foi a assinatura do termo de conciliação com as comunidades quilombolas de Alcântara. Onde o território tem 152 comunidades e cerca de 3.350 famílias. Um ato histórico de luta e reivindicação dessas famílias, que há tanto tempo resistem”, afirmou.
Autoridades
Além do chefe do executivo também estiveram presente o ministro do Desenvolvimento Agrário Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira; representantes de Comunidades Quilombolas de Alcântara e do Brasil e integrantes de órgãos e entidades do MDA, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Advocacia-Geral da União (AGU), Ministério da Igualdade Racial (MIR) e Ministério da Defesa (MD).
Entenda como funciona o processo
Os passos para a regularização quilombola é composto por quatro fases: a publicação do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), a Portaria de Reconhecimento, o Decreto de Interesse Social e o Título de Domínio.
Apesar de que em seu terceiro mandato o presidente Lula ter assinado 12 decretos e realizado a entrega de 32 títulos – um avanço em comparação ao período de 2019 a 2022, quando apenas 1 decreto e 23 títulos foram concedidos -, vale ressaltar que a luta está apenas no início.
De acordo com censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2022 cerca de 95,67% dos quilombos não possuem títulos definitivos para as suas terras. Além disso, é preciso enfatizar que em muitos deles as lideranças são ameaçadas pelo simples fato de fazer o que está ao seu alcance para manter o lugar onde estão suas raízes, cultura e ancestralidade.
Atos realizados no dia 19/09
• Assinatura do Termo de Conciliação, Compromissos e Reconhecimentos Recíprocos, relativo ao Acordo de Alcântara.
• Assinatura da Portaria de Reconhecimento do Território Quilombola de Alcântara.
• Assinatura da Portaria de Declaração de Interesse do Serviço Público (PDISP) para os imóveis/territórios da União no Território Quilombola de Alcântara (nome do ato a ser confirmado pelo MGI).
• Acordo de Cooperação Técnica entre AGU, TRF1 e TJ/MA para troca de informações e promoção de esforços conjuntos visando acelerar a tramitação e finalizar as ações judiciais de desapropriação e discriminatórias dos Territórios Quilombolas, para viabilizar o registro dos imóveis em nome da União e a conclusão do processo de titulação quilombola (a confirmar).
• Assinatura do Decreto de Declaração de Interesse Social do Território Quilombola de Alcântara.
• Assinatura de 10 decretos de interesse social:
1. Aroeiras, município de Pedro Avelino/RN;
2. Sítio Pavilhão, município Bom Jesus/RN;
3. Curral de Pedra, município de Abaré/BA;
4. Capão das Gamelas, município de Seabra/BA;
5. Morro Redondo, município de Seabra/BA;
6. Cangume, município Itaoca/SP;
7. São Roque, municípios Praia Grande/SC e Mampituba/RS;
8. Arvinha, municípios Coxilha e Sertão/RS;
9. Alto da Serra do Mar, município Rio Claro/RJ;
10. Jaó, município Itapeva/SP.
Um pouco sobre a cidade maranhense
Um lugar repleto de história, é uma boa forma de definir Alcântara. A cidade situada no estado do Maranhão foi fundada em meados do século XVII, na época em que foi estabelecida como uma vila pelos colonizadores portugueses, e tornou-se inicialmente um importante ponto de comércio e exploração agrícola, com ênfase para a produção de açúcar e algodão.
Passados 100 anos a região se desenvolveu e virou um centro de atividade econômica e cultural. Quem vai conhecer a região se depara com a cultura dos quilombos e um patrimônio arquitetônico devido às suas inúmeras construções coloniais.
Desde sua formação, diversas comunidades quilombolas se desenvolveram mais sempre preservando práticas culturais, sociais e econômicas. Durante o século XX, enfrentaram desafios, como a pressão pela exploração de suas terras e a falta de reconhecimento legal. Nas últimas décadas, Alcântara ganhou destaque devido ao Centro de Lançamento de um espaço da Agência Espacial Brasileira no município, que começou a operar na década de 1980 sob comando da Aeronáutica da Força Aérea Brasileira e, consequentemente, atraiu atenção internacional para a cidade.
Texto por Thaís Rodrigues (CONAQ /Uma Gota No Oceano), publicado às 11:42:50
Categoria: Territórios Quilombolas