
22 de março de 2025
Diretora Executiva Ana Toni recebe CONAQ para debater participação dos quilombolas na COP 30
Reunião buscou fortalecer a voz dos afrodescendentes na conferência climática que será realizada em novembro em Belém, no Pará
Na manhã desta sexta (21), a CONAQ foi recebida no Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima pela CEO da COP 30, Ana Toni. Na ocasião, também estiveram presentes representantes do Ministério de Igualdade Racial, Itamaraty e MMA.
A Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas que será realizada em Belém do dia 10 a 21 de novembro, representa um momento crucial para a definição de políticas e compromissos globais em relação ao meio ambiente. Tendo esse ponto em mente, a participação do movimento nesse evento é fundamental para garantir que nossas vozes sejam ouvidas e que suas demandas sejam incluídas nas decisões internacionais sobre mudanças climáticas e justiça ambiental.
Durante a confluência, a autoridade que, também está à frente da Secretaria Nacional de Mudanças do Clima, foi questionada sobre a carta da COP 30 que não menciona o racismo ambiental e tampouco os afrodescendentes em um país onde 55,4% da população é preta ou parda segundo pesquisa do IBGE de 2022.
A cientista política reconheceu a falha neste primeiro comunicado e agradeceu às lideranças quilombolas por terem questionado esse ponto importante, que de acordo com ela ainda deve entrar na pauta nos próximos comunicados da organização.
“Muito bom esse diálogo franco, na carta a gente não tinha uma estratégia de exatamente o que a gente está conversando aqui. E eu preciso ser sincera de que nenhum tema específico territorial a carta reflete. A gente falou de raça três vezes , mas o problema não é falar, é saber que estratégia queremos ou não queremos, se é específica de quilombola, se é especificar para territórios em geral, que entram outros, e a gente não tem ainda uma estratégia específica, é a realidade”, afirmou.
Conexão com o meio ambiente e biodiversidade
Outro tópico debatido foi a relação ancestral e sustentável que as comunidades possuem com a terra e os recursos naturais. Os conhecimentos passados de geração em geração são referências e compreendem desde o manejo do solo, preservação das florestas até o uso consciente da água.
No entanto, os coordenadores presentes na reunião deixaram escurecido que apesar desse papel de “guardiões”, tanto a população negra rural quanto a periférica estão entre as mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas, secas prolongadas e desmatamento. E por isso, é mais do que necessário que o estado e Conferência das Partes abordem e levem soluções para reverter esse problema que, cuja forma de reverter nós sabemos que está em nossos saberes.
Racismo ambiental
A crise climática afeta desproporcionalmente as populações marginalizadas que muitas vezes enfrentam maiores dificuldades no acesso a políticas de adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Na COP 30, a presença dessas comunidades é essencial para que a justiça climática seja debatida e implementada de forma equitativa, ao contrário do que ocorre atualmente devido a falta de verba para a pauta.

“Quando se lança todo qualquer financiamento no mundo sobre clima, sobre clima quilombola indígena, extrativista do que chega daquele bolão até nós é muito pouco de tudo que somos nós que somos responsáveis. Então não dá para que a gente não coloque como prioridade que esses povos acessem esse financiamento climático, porque são eles que dão resultado lá na ponta não são as não grandes organizações que estão por aí. Se o Estado brasileiro quer, de fato, fazer uma transformação, invista em nós”, argumentou Biko Rodrigues, Coordenador nacional e articulador político.
Construção de soluções sustentáveis
Os saberes tradicionais dos quilombolas podem contribuir significativamente para soluções sustentáveis no combate às mudanças climáticas. Modelos de agroecologia, reflorestamento e conservação da biodiversidade são práticas que já fazem parte do cotidiano dessas populações e podem servir de referência para políticas ambientais mais eficazes. Porém, não adianta enfatizar todos esses pontos sem mencionar a titulação dos quilombos. Sem a garantia plena dos territórios é extremamente difícil pôr em prática inúmeros projetos e assegurar o bem estar das lideranças e de todos que ali vivem.
2025 é o ano onde o Brasil vai sediar o principal evento sobre clima da Organização das Nações Unidas (ONU), mas assim como ocorreu na COP16 direcionada a biodiversidade onde o termo afrodescendentes e entregas de títulos aos povos palenques foram realizadas pela vice-presidente da Colômbia Francia Marquez, o movimento também espera uma ação semelhante do estado brasileiro.

“Nós, movimento quilombola, estamos prontos, temos informação, temos dados, sabemos onde estamos, nós sabemos em quantos hectares estamos, sabemos qual o tamanho da área que nós estamos preservando. Com a ajuda da senhora e junto do estado colaborar com o que nós temos, mas só o estado pode fazer esse processo para que nós possamos de fato fazer entregas significativas e continuar lutando para que uma democracia mais forte e mais sólida”, pontuou Johnny Martins, coordenador e presidente da Negra Anastácia que também enfatizou a luta contra o avanço do agronegócio e de outras atividades predatórias.
Afroturismo, iniciativas para geração de renda dos povos tradicionais do estado do Pará durante a COP 30, a necessidade de ter um pavilhão afrodescendente, presença dos quilombolas nos espaços de tomadas de decisão, diálogo com autoridades dos países africanos e a garantia de uma presença de peso do movimento foram outros tópicos debatidos na reunião.
Esse último, por exemplo, foi detalhado por Selma Dealdina Mbaye, Articuladora Política da CONAQ. Na ocasião, a liderança fez um retrospecto da participação dos quilombolas nas edições das Conferências de Parte iniciando em Glasgow (COP 26) e fechando em Cali (COP 16), Colômbia. O que todas elas têm em comum: uma participação minoritária.

“Nós estamos participando mais ativamente desde a COP 26 com quatro lideranças quilombolas, depois a gente vai para a COP do Egito, a COP 27, com 11 pessoas sendo 10 quilombolas e uma tradutora, porque a língua ainda é um empecilho para a gente, uma barreira, mas ela não pode ser perpetuada. Na COP 28, em Dubai, a gente foi com 9 representações quilombolas, a COP de Baku a gente estava em sete lideranças quilombolas, porque financeiramente não é muito fácil de ir para esses espaços. E a gente conseguiu, inclusive, com o apoio do próprio ICS, na época não só com recurso, mas também ajudando com as credenciais, como a Uma Gota no Oceano, o Fundo Casa, que tem arcado com as despesas das últimas quatro COPs para que os quilombolas pudessem participar”, relatou.
Ao final, a CEO, assim como outros órgãos anotaram todas as demandas levadas pela CONAQ e se comprometeu a dar uma devolutiva e não medir esforços para que os quilombolas e afrodescendentes tenham visibilidade na Conferência.
“Estamos caminhando porque a gente acha que essa inclusão, todo mundo entendeu que está acontecendo em qualquer espaço da COP vai ser fundamental. A gente começou já essa conversa sobre pavilhões, mas é importante fazer de maneira coordenada. São 43 ministérios e todos estão com planos para a COP 30. Está sendo uma alavanca de demandas, mas todos eles já estão levando suas prioridades para a Casa Civil. A gente tem uma oportunidade grande de trazer esses temas para pauta e a gente poder manter essa conversa fluida. E a gente promete fazer outra carta melhor”, concluiu a autoridade.
Participação efetiva
A presença dos afrodescendentes na Conferência não deve ser apenas simbólica, mas sim ativa e decisiva na construção de políticas ambientais. Em outras palavras, isso significa garantir espaços de fala e inclusão em acordos que impactam diretamente seus modos de vida.
É preciso frisar também que é uma oportunidade crucial para fortalecer a luta por justiça e garantir que não seja apenas uma questão de representatividade, mas espaço para debater a titulação dos territórios e, é claro, a construção de soluções verdadeiramente justas e eficazes para mitigar os problemas da crise climática.
Texto por Thaís Rodrigues CONAQ/Uma Gota No Oceano, publicado às 12:30:03
Categoria: COP30