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Carta aberta de repúdio ao decreto do Zema, e em defesa dos direitos dos povos e comunidades tradicionais do estado de MG
19 de setembro de 2024

Carta aberta de repúdio ao decreto do Zema, e em defesa dos direitos dos povos e comunidades tradicionais do estado de MG

Zema 'passa a boiada' e ignora comunidades tradicionais em novo decreto, denunciam organizações

Em meio à seca histórica e às fumaças que cobrem os céus do Brasil, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, em mais um ato perverso de ataque aos direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais e da Natureza, publicou, no dia 11 de setembro de 2024, o Decreto nº 48.893/2024, que viola o direito dos Povos e Comunidades Tradicionais à Consulta Livre, Prévia, Informada e de Boa-fé, e, favorece o avanço dos grandes projetos do capital que causam morte e devastação nos territórios tradicionais e compromete as condições de vida de toda a sociedade e da biodiversidade. O Decreto em si já é uma aberração jurídica, uma vez que a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) não precisa de regulamentação para ser plenamente aplicada. Um Decreto semelhante a este editado pelo Governador do Pará já foi anulado. Desde 2003, quando entrou em vigor no Brasil o Tratado Internacional da Convenção 169 da OIT, suas disposições são obrigatórias e nenhum órgão governamental pode descumpri-la ou limitar os direitos nela abarcados. Além disso, não houve nenhuma participação ou consulta às Comunidades, violando o artigo 6° da mencionada Convenção.

O teor deste decreto é praticamente o mesmo da Resolução Conjunta SEDESE/SEMAD Nº
1, de 4 de abril de 2022, que foi revogada, após muita pressão dos Movimentos Sociais, Povos e Comunidades Tradicionais. Este Decreto eivado de ilegalidades e de inconstitucionalidades busca amordaçar e aniquilar os direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais protegidos pela Convenção 169 da OIT.

Destacamos outros pontos críticos e inaceitáveis do Decreto:

Limita o direito à Consulta Prévia somente aos Povos Indígenas, Comunidades Quilombolas e Comunidades e Povos Tradicionais certificadas, pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), Fundação Cultural Palmares ou pela Comissão Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de MG. De forma similar, cria nova definição de territórios tradicionais condicionada à sua efetiva titulação e reconhecimento pelo Estado, violando mais uma vez o direito à autodeterminação dos Povos e Comunidades Tradicionais.

 Nega o direito de Consulta às Comunidades e Povos Tradicionais, cujos Territórios estejam localizados em áreas urbanas consolidadas. Isso afeta diretamente centenas de comunidades localizadas em zonas urbanas, como Povos de Terreiro, Indígenas em situação urbana, Acampamentos Ciganos e Comunidades Carroceiras. Particularmente, esse aspecto do Decreto favorece o avanço do licenciamento do Rodoanel (o famigerado Rodominério!) na Região Metropolitana de Belo Horizonte, afetando imediatamente o direito e os territórios de centenas de comunidades.

Transfere às empresas a responsabilidade de realização da Consulta, no caso de projetos da iniciativa privada. Além de ser uma grave violação ao que determina a Convenção 169, isto poderá aumentar ainda mais a violência e assédio das empresas sobre os territórios.

O Decreto também condiciona a exigência da realização de Consulta às situações em que os territórios estejam no máximo a 3 Km de distância dos empreendimentos, ignorando os impactos sistêmicos e difusos dos empreendimentos, seja pela circulação e fluxos do ar, das águas e das espécies nos territórios.

Não se pode ignorar a relação do Decreto com o contexto atual da política do Governo Zema, no qual o Governo apoia o avanço da mineração predatória, que tem por alvo, em grande medida, explorar áreas de Territórios Tradicionais, em diversas regiões do estado. Este Decreto é para “passar a boiada”.

Diante de tantas violações, reafirmamos nosso compromisso em garantir que os Povos e Comunidades Tradicionais tenham acesso à informação e possam participar ativamente dos processos que impactam seus modos de vida e exigimos a imediata revogação do Decreto Nº 48.893/2024, garantindo de forma plena o Direito das Comunidades e Povos Tradicionais à sua autodeterminação. Neste momento, em que a “terra geme em dores de parto” (Cf. Rm 8,22), é urgente avançarmos nas
lutas concretas nos territórios, em defesa dos Povos e Comunidades Tradicionais e de todos os seres vivos que formam a comunidade que nutre nossa mãe Terra. Portanto, é absurdo um Decreto como este em tempos de Emergência Climática. As sirenes dos eventos extremos estão gritando de forma estridente. Revogação e Anulação do Decreto 48.893/2024, JÁ! Apelamos a todas as autoridades compromisso com a derrubada deste brutal Decreto.

Assinam esta carta:

  1. Comissão Pastoral da Terra – Minas Gerais (CPT/MG)
  2. Conselho Pastoral dos Pescadores – Minas Gerais (CPP/MG)
  3. Pastoral da Juventude Rural – Minas Gerais (PJR)
  4. Conselho Indigenista Missionário – Regional Leste (CIMI)
  5. Cáritas Brasileira –Regional Minas Gerais
  6. Rede Igrejas e Mineração – Minas Gerais
  7. Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES)
  8. Irmãs Franciscanas Missionárias Diocesanas da Encarnação
  9. Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade (AFES)
  10. Serviço Interfranciscano de Justiça, Paz e Ecologia (SINFRAJUPE)
  11. Sociedade Brasileira de Etnobiologia eEtnoecologia
  12. Grupo de Pesquisa de Educação Popular PluriEtnoDecolonial-UNIMONTES
  13. Núcleo de Estudos e Pesquisas Regionais e Agrários – UNIMONTES
  14. Observatório dos Vales e do Semiárido Mineiro – UFVJM
  15. Observatório Fundiário do Vale do Jequitinhonha – UEMG Diamantina
  16. Kaipora-Laboratório de Estudos Bioculturais – UEMG Ibirité
  17. Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Campo (MTC)
  18. Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM)
  19. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST/MG)
  20. Movimento de Ressurgência Purí-MRP Serra dos Purí
  21. Povos e Comunidades Tradicionais de Religião Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA)
  22. Associação Nacional de Ação Indigenista (ANAI)
  23. Terra de Direitos
  24. “Escola” de Direito Agrariambientale da Jusdiversidade Montes Claros
  25. Legião de Assistência Recuperadora -LAR
  26. Setor Ambiental do Vicariato Episcopal para ação social, política e ambiental da Arquidiocese de Belo Horizonte – VEASPAM
  27. Saberes do Território, organização da sociedade civil para salvaguarda da sócio biodiversidade na região dos Inconfidentes
  28. FONSANPOTMA (Fórum de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana)
  29. Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo -APOINME 
  30. Coletivo de Implantação do Campus Quilombo Minas Novas do Instituto Federal de
    Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais – IFNMG
  31. Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular
  32. Frente Mineira de Luta das Atingidas e dos Atingidos pela Mineração – FLAMa MG
  33. Jornal A Sirene
  34. Coletivo dos Povos e Comunidades tradicionais Atingidas pelo rodoanel
  35. Núcleo de estudos afro-brasileiros e indígenas do IFNMG-Campus Salinas
  36. Observatório de Protocolos Comunitários de Consulta e Consentimento Prévio, Livre e Informado (OPCPLI)
  37. Observatório da Universidade Federal de Itajubá – Campus Itabira-MG
  38. Observatório de Conflitos e Confluências Rurais do Rio Doce (OCDOCE)
  39. Projeto de Assessoria a Comunidades Atingidas por Barragens e Mineração (PACAB) – UFV
  40. Federação Quilombola do estado de Minas Gerais N’Golo
  41. Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA)

Obs.: Outras “organizações, entidades e Movimentos Sociais que quiserem assinar esta Carta Aberta de Repúdio, favor enviar nome e e-mail para frei Gilvander – gilvanderlm@gmail.com