
10 de março de 2025
Educação: Falta de energia afeta o ensino nas comunidades quilombolas
Ausência de eletricidade é mais uma barreira a ser superada pelos quilombos espalhados pelo Brasil
Nos últimos anos diversos setores tiveram um salto impressionante graças à tecnologia, isso compreende desde a modernização de meios de pagamentos até o aperfeiçoamento e implementação de ferramentas de educação. No entanto, do que não adianta dispor de tantos recursos se eles não chegam a todos de forma igual? Essa é a situação de muitos quilombos espalhados pelo Brasil.
Inúmeras comunidades não possuem acesso a eletricidade – algo indispensável para dispor de uma boa qualidade de vida -, impactando assim o seu dia a dia e afetando, obviamente, o sistema de ensino das instituições nessas localidades.
A ausência de infraestrutura elétrica nas comunidades é um obstáculo significativo para o acesso e a qualidade do ensino, mantendo as desigualdades e dificultando o desenvolvimento pleno da população. Porém, essa situação é no mínimo revoltante já que em um país que constantemente bate na tecla da transição energética, uma parcela dos quilombolas sequer tem acesso a um recurso tão básico e garantido em lei.
Tendo em mente este cenário, vamos detalhar abaixo os principais obstáculos, desafios enfrentados e possíveis soluções para que as comunidades de fato sejam incluídas no fornecimento de eletricidade. Confira!
Barreiras?
Grande parte das comunidades ficam localizadas em regiões rurais e afastadas dos centros urbanos, e a existência deste isolamento é um dos fatores que contribuem para o acesso limitado a serviços básicos como saúde, educação e, principalmente, energia elétrica.
Em 2023 e 2024, diversas comunidades tiveram que recorrer à justiça e/ou à imprensa para garantir o que seu por direito. Foram os casos de quilombos localizados no Pará, Espírito Santo e São Paulo. Essas localidades e muitas outras ainda apresentam uma grande carência de infraestrutura energética comprometendo diretamente diversos setores, incluindo o processo educacional.
A falta de eletricidade em muitos quilombos é mais do que um simples desconforto. Trata-se de uma barreira concreta que vai de encontro ao exercício de direitos fundamentais, entre eles à educação de qualidade, que deve ser oferecido de forma igualitária a todos os cidadãos, independentemente da localização ou contexto socioeconômico.
Impactos na educação
Limitações no acesso às tecnologias educacionais
Em um mundo cada vez mais digitalizado, o uso de tecnologias na educação tem se tornado mais do que fundamental. O acesso à internet, computadores, tablets e outros recursos tecnológicos é essencial para os estudantes, pois amplia as possibilidades de aprendizado, além de promover a inclusão digital.
Nas comunidades quilombolas, a falta de energia elétrica é um obstáculo considerável para o uso de tecnologias educacionais. Sua ausência impede que escolas locais ofereçam recursos como computadores, projetores multimídia e conexão com a internet. O uso de plataformas digitais para o aprendizado remoto, uma tendência crescente em todo o mundo, também se torna inviável, deixando os alunos dessas à margem do avanço tecnológico.
Além disso, sem acesso constante à energia elétrica, os estudantes ficam privados de recursos essenciais como vídeos educacionais, softwares interativos e outras ferramentas que aliados ao ensino dos educadores poderiam enriquecer o processo de aprendizagem. Essa falta de acesso ou até mesmo substituição de profissionais cria uma lacuna educacional significativa, fazendo com que os alunos quilombolas fiquem em desvantagem em relação a outros estudantes que têm acesso a essas a todo o conteúdo didático.
Recentemente, moradores do Território Kalunga em Cavalcante fizeram críticas ao Goiás Tec, um programa da Secretaria Estadual de Educação (Seduc) de Goiás que oferece ensino médio regular a estudantes de comunidades distantes e de difícil acesso. No entanto, se já é ruim não dispor de pessoal capacitado, imagina tentar ofertar educação através de equipamentos eletrônicos onde a energia não é estável ou existente.

Prejuízos nas condições de estudo
A educação de qualidade depende de condições adequadas para o aprendizado. A luz é um fator fundamental nesse processo, e a falta de eletricidade compromete a capacidade dos alunos de estudar em casa ou até mesmo de frequentar a escola à noite.
Muitas comunidades quilombolas têm escolas que funcionam em turnos noturnos, o que é comum devido à dificuldade de deslocamento para as escolas ou à disponibilidade de tempo dos alunos. No entanto, sem eletricidade, as aulas noturnas tornam-se praticamente inviáveis, pois a falta de iluminação adequada impede que os alunos acompanhem as lições e realizem atividades de estudo.
Além disso, muitos estudantes dependem da luz elétrica para realizar suas tarefas escolares em casa. Quando não há energia, muitos têm que recorrer a fontes de luz alternativas, como lamparinas ou velas, que não oferecem a mesma qualidade de iluminação. Isso dificulta a leitura, a escrita e o estudo em geral, afetando o desempenho escolar dos alunos e contribuindo para a evasão escolar.
Escassez de recursos pedagógicos
Outro impacto direto é a falta de materiais didáticos modernos: livros digitais, vídeos, e-books e outros conteúdos multimídia, dependem de equipamentos eletrônicos que não podem ser utilizados sem energia. A dificuldade de acesso a esses materiais reduz as opções de aprendizado para os estudantes e limita o desenvolvimento de habilidades importantes, como a capacidade de pesquisa, a autonomia no aprendizado e o domínio de novas tecnologias.
Sem esquecer que a falta de eletricidade também impede que as escolas ofereçam equipamentos como projetores, computadores e até mesmo sistemas de som para tornar as aulas mais dinâmicas e interativas. E, com essa limitação há um impacto na qualidade do ensino e pode contribuir para o desinteresse e, consequentemente, na evasão escolar dos alunos, já que atualmente os métodos de ensino tradicionais, muitas vezes, não conseguem despertar o mesmo engajamento que as tecnologias disponibilizadas na sociedade atual.
Dificuldades no acompanhamento escolar e formação continuada de educadores
Outro ponto importantíssimo está direcionado a influência negativa na capacitação dos professores e na implementação de programas de acompanhamento escolar. Para que os educadores possam se manter atualizados com as metodologias de ensino mais modernas e participar de cursos de formação continuada, o acesso à internet e a energia são fundamentais. Sem eletricidade, a realização de cursos online, a pesquisa acadêmica e a utilização de materiais pedagógicos modernos tornam-se praticamente impossíveis.
Além disso, sua falta dessa infraestrutura básica pode prejudicar também a gestão escolar, dificultando a comunicação entre pais, alunos, os dados sobre a evolução acadêmica, o acompanhamento da frequência escolar e a realização de reuniões.
Um exemplo disso, foi a situação vivida pelas então estudantes do município de Barreirinha. Amazonas no Território Andirá. Elas que participaram da Escola Nacional de Formação de Meninas Quilombolas relataram em março de 2024 a violação ao direito à educação no estado.
Durante visitas, foram identificados na região vários problemas, incluindo a falta de infraestrutura das escolas, dificuldade de acesso à internet, problemas na distribuição de merenda escolar, falhas na formação de professores e necessidade de aperfeiçoamento do processo de elaboração dos projetos político-pedagógicos das escolas quilombolas. Confira o vídeo com o relato delas abaixo:
Possíveis soluções para a inclusão energética e o desenvolvimento educacional
Investimentos público
Primeiramente, apesar de existir iniciativas privadas é uma responsabilidade única e exclusivamente do governo desempenhar o fornecimento de energia para as comunidades quilombolas. Desde a instalação de redes de energia elétrica, a implementação de sistemas de geração local e a melhoria da infraestrutura escolar são ações que podem ser adotadas para garantir que os quilombos tenham acesso aos mesmos recursos que as áreas urbanas.
Capacitação e formação de educadores
Nem todos os territórios dispõem de escolas que abranjam toda a vida educacional de uma pessoa. Assim, muitos acabam se vendo forçados a terem que deixar seus quilombos e irem para a cidade para concluir os estudos.
No entanto, na maioria dos casos nestas localidades não possuem profissionais capacitados para dar continuidade ao ensino focado nas comunidades, suas culturas e ancestralidade. Dessa forma, há apenas a educação eurocêntrica onde os afrodescendentes são vistos apenas como descendentes de escravizados.
Então, conseguiu perceber como a ausência de um item tão básico e fundamental como a energia pode afetar inúmeras vidas? É preciso que o estado brasileiro arregace as mangas o quanto antes para executar o que deveria ser feito há muito tempo: implementar eletricidade de qualidade e com valor justo, investimentos em infraestrutura e capacitação de educadores que passe a diante a história dos quilombolas e não as apague como a sociedade tenta fazer diariamente.
Foto de capa: Crédito: O Corre Diário
Pará:
Espírito Santo:
Sem água e energia: serviços essenciais são negados aos quilombolas
São Paulo:
MPF quer ligação imediata de energia elétrica para comunidade quilombola de Votorantim (SP)
Texto por Thaís Rodrigues CONAQ/Uma Gota No Oceano, publicado às 20:47:40
Categoria: Educação Quilombola