
25 de fevereiro de 2025
Transição justa para quem? CONAQ e ICS unem forças para mapear e garantir acesso a energia a todos quilombos
Atualmente há inúmeras comunidades que não possuem acesso a eletricidade em pleno século 21
Invisibilizados perante as autoridades e sociedade, os quilombos representam uma parte fundamental da história e da cultura do Brasil. Há séculos as comunidades negras rurais e em algumas localidades, urbanas, seguem resistindo à opressão, defendendo seus territórios que se tornaram verdadeiros símbolos de luta e preservação cultural.
No entanto, apesar de ter um papel inegável na construção desse país, boa parte dos cidadãos que ali vivem segue encontrando dificuldades para garantir condições dignas de vida, sendo a falta de energia elétrica um dos principais problemas.
Tendo em mente o contexto de transição energética que o governo insiste em bater na tecla, surge a famosa pergunta de um milhão: essa transição será justa para os quilombolas?
A realidade dos quilombos
É inegável que a eletricidade é um recurso crucial para a vida moderna. Ela influencia diretamente a saúde, a educação, a segurança e o desenvolvimento econômico de qualquer população. Porém, segundo diversos levantamentos, milhares de quilombolas ainda vivem sem acesso regular à energia elétrica. Esse problema decorre, entre outros fatores, da falta de infraestrutura, do descaso de políticas públicas e das dificuldades geográficas que muitas dessas comunidades enfrentam.
Sem eletricidade, a qualidade de vida é drasticamente afetada. A ausência de iluminação dificulta atividades básicas, como o estudo de crianças e jovens, a realização de trabalhos noturnos e até mesmo a segurança nas vilas. A conservação de alimentos e medicamentos também é comprometida, agravando questões de saúde pública. Além disso, a ausência de energia limita o acesso à tecnologia e comunicação, isolando ainda mais essas comunidades.
Impactos na educação e na economia
A falta de energia elétrica compromete o aprendizado de crianças e adolescentes quilombolas. Sem iluminação adequada, muitos não conseguem estudar à noite, principalmente em áreas onde as escolas são distantes e o tempo de deslocamento toma boa parte do dia. A falta de energia também impede o uso de tecnologias educacionais, como computadores e internet, dificultando o acesso à informação e ao conhecimento.
No setor econômico, a ausência de eletricidade restringe as possibilidades de produção e comercialização de bens. Pequenos agricultores, pescadores e artesãos quilombolas encontram dificuldades em armazenar produtos, expandir seus negócios e acessar mercados mais amplos. Sem energia, também é impossível a instalação de pequenos empreendimentos que poderiam gerar renda para as famílias locais.
Transição energética x justiça social
Não é de hoje que a substituição de combustíveis fósseis por fontes renováveis, tem sido debatida globalmente como um caminho para a sustentabilidade. Mas antes de abordar esse tema é preciso levar em conta diversos pontos para evitar que essa transição não negligencie populações historicamente marginalizadas. Em outras palavras, para os quilombolas, a “transição justa” precisa ir além da simples substituição de fontes de energia; é necessário garantir que essas comunidades tenham acesso efetivo à eletricidade, de forma equitativa e sustentável.
Tendo em mente essa pauta onde antes é preciso levar em conta que diversas comunidades sequer possuem eletricidade surge a importância do projeto com o Instituto Clima e Sociedade (ICS).
Através da parceria entre ambas organizações será realizado um levantamento dos territórios que não têm energia, seja ela elétrica, eólica ou solar. Várias localidades espalhadas pelo Brasil possuem uma realidade que apesar da lei assegurar o direito a necessidades básicas ainda não têm acesso e quando há ele não possui boa qualidade e tem um custo benefício elevado.
“O projeto prevê ouvir as lideranças impactadas por grandes projetos de energia, como a gente teve no Quilombo Sumidor no Piaui e em Abaitetuba no Pará. Então a gente quer ir a campo ouvir e ver com nossos próprios olhos a realidade que essas comunidades vivem e que são afetadas, impactadas diretamente com os grandes empreendimentos de energia, inclusive de injustiças praticadas, de energia que ilumina a cidade vizinha, mas que não ilumina o Quilombo, ou de famílias que pagam verdadeiro absurdos nas tarifas de energia e mesmo pagando caro não tem uma energia de qualidade”, relatou Selma Dealdina Mbaye, articuladora Política da CONAQ.

A fala da liderança do movimento se faz totalmente necessária já que de fato quando o foco é energia renovável no Brasil, por exemplo, há a priorização de uma parcela da sociedade e um completo descaso com as comunidades rurais e quilombolas. E apesar de ocorrer a implementação de tecnologias como paineis solares e pequenas centrais hidrelétricas as mesmas precisam ser acompanhadas de políticas públicas que assegurem o acesso igualitário e respeitem a autonomia de todos sem exceção.
A falta de energia nos quilombos evidencia um problema estrutural que precisa ser resolvido com urgência. Em outras palavras, a transição energética não pode ser apenas uma mudança tecnológica; ela deve ser um processo justo que inclua todos os brasileiros, especialmente aqueles historicamente excluídos como argumentou Selma, a seguir: “É preciso discutir com os quilombolas uma proposta de energia, mas também apresentar para a sociedade que energia queremos. Dessa forma, acho que em um processo de consulta prévia, livre e informada, nada mais justo do que os quilombolas serem, para além de ouvidos, escutados. Porque a gente precisa fazer esse processo da escuta e a partir daí atender as necessidades que essas comunidades precisam”, pontuou.
Texto por Thaís Rodrigues CONAQ/Uma Gota No Oceano, publicado às 20:34:59
Categoria: Territórios Quilombolas